sexta-feira, 11 de maio de 2018

Sobre ser inteira longe da sua presença

A verdade é que, antes de você, eu jamais havia me sentido inteira. Eu jogava justamente com os meus pedaços, cacos, partículas. Por vezes, sentia essas partículas vibrando e o meu corpo, sábio, reagia à altura em manifestações orgásmicas - os pelos se eriçavam, o sorriso se abria grande sem que houvesse um convite o convocando, as piruetas e as quedas deliciosas aconteciam. Estes instantes aconteceram, e alguns dos eus que me habitam são testemunhas disso. Mas os instantes se faziam nos espaços - e para se ter espaço é preciso não ser, não se entender como completo. Um cômodo completo é um cômodo lotado. Nada nele é encontrado. O corpo anda contraído, esmagado, sem passagem. Apequena-se sob a pena de não caber ali. Apequena-se para não ser obrigado, impelido a mudar-se. Mudar dá trabalho e lá fora não há móveis, não há estrutura. O que há então? Espaço e tudo aquilo que se faz com ele.

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