quarta-feira, 20 de novembro de 2013

No ar



Vejo rastros de luz. Linhas, sinais, raios no céu. Eles vem através de nós, se entranhando na gente, passando eu pra você e você pra mim; fincando os frutos dessa conexão inegável e, simultaneamente, fazendo-os dançar. E os nossos pedaços vão caindo pelo chão, voando pelo ar. Gotas de mim e de você, partículas, matéria. Elas vem se misturando e transformando-se pela influência do externo; do outro; de nós, juntos. As gotas, os pelos, os suspiros. Eles vem caindo, dançando, bem suavemente. E tudo acaba numa eterna troca, que na verdade não acaba nunca. 

meia dúzia

Sonhei contigo ontem, ché-
ri.
Eu juro.
Depois de tantos meses sem bei-
jos
sem to-
que
sem chei-
ro
sem nós naquele emaranhado de cor-
pos
onde não se divide nós do-
is
não se vê onde eu aca-
bo e onde come-
ça vo-
cê.

Mas achei melhor nem te falar.
Vivemos nesse pacto
de calar verda-
des.
Nao sei se,
assim,
achamos que a fazemos maiores
ou se é fraqueza mesmo
pu-
ra
e simples-
mente.
Quem sa-
be?

Pena.
Íamos bem.
Te dei o meu telefone e to-
do,
simplesmente to-
do,
o meu corpo,
entregue
como se tivesse sido sem-
pre
teu.
Como se cê fosse nada menos qu'a
chave
para abrí-
lo
por com-
ple-to,
a chave que por tanto tempo
procu-
rei.

Senti saudades.
Ás vezes parecia até
qu'eu ia morrer de-
las.
Mas não, fui sobre-
vivendo
sem ti
me re-
fazendo
entre um passo e
outro
entre uma dan-
ça
e outra mais.

E fiquei bem.
Parei de te re-
moer,
até que chegou essa noi-
te
em que eu sonhei
com
vo-
cê.

Engulo a saliva,
respiro fun-
do,
busco afastar os pensamen-
tos,
mas eles insis-
tem em
vir
e me confun-
dir.

Pensei que cê iria me visitar, afinal
te passei meu endere-
ço
e até disse que era bem-
vindo
e que esse tam-
bém
é um bom país
pra se passar aniversá-
rios.

Mas cê não entendeu.
Ou não escu-
tou.
Ou,
pior,
escutou,
entendeu
e não quis.
Mas prefiro acreditar nas primeiras hipó-
teses.

Eu teria te esperado.
Pelada,
em roupa e pêlo
mas com pele de so-
bra
e cheia de
a-
pelo.
Mas acontece que
cê nunca apare-
ceu.

No meu sonho,
po-
rém,
cê vinha
bonito e pronta-
mente.

Lutávamos contra o outro
e contra nós
mes-
mos,
em forma de sexo.
Disputa justa,
mas sem re-
gras.
Vale tu-
do.

E, então, calamos mais uma
vez.
E eu perdi o resto da sanidade qu'eu
inda ti-
nha
olhando direta-
mente
pros seus olhos
infini-
tos.
Parece que cê fez de propó-
sito,
quem mandou olhar
de vol-
ta?

E, depois de to-
da
a entrega,
cê partiu.
Mas me deixou,
antes,
uma carta na me-
sa
da sala.
Me tremi to-
da
pra lê-
la,
mas li.
Nela, meia dú-
zia
de pala-
vras.
Mais do que suficien-
tes.
Expressando tudo que tam-
bém trans-
borda
do meu pei-
to
já há tan-
to.

Me aceita, meu
bem.
Se ache-
ga,
me bei-
ja
e me diz pra
ficar.
What's the point,
ché-
ri,
de se se-
pa-
rar
sí-
la-
bas
assim sem nem
pre-
ci-
sar.
Me deixa te mostrar que a gente cabe sim numa mesma frase,
e inda pode ser coeso.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

caidinhos

cê me disse que vê muita vida
nestes meus olhos amarelos
e disse assim mesmo
"amarelos"
e,
em seguida,
discutimos por longos minutos
sobre o tom da cor dos tais

cê disse que relutou muito
em se perder neles
mas que desistiu, já fraco
- era inútil, concluiu

por último, ainda disse
que a forma deles, caidinhos
só dá a eles mais humanidade,
mais subjetividade,
mais força,
uma vez que cê vê a força como
coragem de mostrar as fraquezas
já que essas,
por
sua
vez,
habitam todos nós,
por mais que mintamos
escondamos
e disfarcemos

- é humano, bonita,
ser sensível e passível de ser
mudada, tocada e d'amar

é preciso ser muito macho pra tal,
masculinamente feminina