sexta-feira, 28 de outubro de 2011

A dançarina e o poeta

     Ela sabia que ele escrevia poesia e, por sinal, havia até comprado o seu livro e dado uma olhadinha ou outra. Ele sabia que ela era uma admiradora da arte - não só dessa, como de tantas outras - e que era um tanto independente e louquinha. O que ele não sabia era que ela, naquele lançamento, também havia cogitado um "e se...?". O que ele não sabia é que ela viria a ser bem mais do que uma garota meio doidinha com quem trocava meia dúzia de besteiras de vez em quando no MSN.
     Ele acompanhava as fotos da viagem dela, durante o período que ela esteve fora por aí, gostava de suas roupas e de seu ímpeto de se jogar no mundo. Ela, por sua vez, não sabia muito bem do que gostava nele, mas gostava.
     Na sua volta, quando se cruzaram pelos corredores da faculdade, ela o cumprimentou com um abraço apertado, sem nem pensar. A questão é que ela sentiu saudades dele - nem ela sabia porque e do que exatamente, mas sentiu. Ele, meio surpreso, recebeu o abraço contente e começou a olhar para ela com outros olhos, começou a pensar com mais intensidade naquele "e se...?".
Passaram horas e dias conversando - horas e dias que mais pareceram semanas, meses - e, certa vez, houve um convite. Não se sabe exatamente quem tomou a iniciativa, se foi ele que insinuou várias vezes que se ela quisesse fazer outra coisa além de dançar forró, ele iria, ou se foi ela e só ela que o chamou para uma cerveja, no meio de um desabafo, planejando desabafar mais com alguém. Com alguém que a quisesse ouvir. Os fatos são que o convite aconteceu, independente de ter ele nascido de um ato de audácia, coragem ou ingenuidade, e ele se deu a liberdade de aceitar e os dois se deram o desplante de não desmarcar com o outro.
     Sentaram no bar e os chopps foram intensificando e intensificando a liberdade entre o futuro casal. Durante a noite, ele falou sobre a sua viagem para a Europa e ela falou um pouco sobre a relação complicada na qual ela estava inserida que, por sinal, era com o amigo dele. Ele, acostumado a ouvir o lado do amigo, ouviu o lado da menina-mulher que estava à sua frente.
     Ele, a desejando, decidiu conquistá-la ali mesmo, não queria esperar. A música romântica contribuiu, mas o mérito foi dele. Disse para ela que queria desbravá-la, que se atraía pela mistério dela... E sabia exatamente como fazer. Fez-la crer (e ver) que merecia mais. Fez-la crer (e ver) quem é que combinava com ela...
     Os dois sabiam que não deviam, mas, depois de minutos e minutos com as testas coladas uma na outra, com as mãos acariciando o rosto do outro, o cabelo, o pescoço; depois de minutos e minutos fazendo que iam se beijam e virando a cara, nesse jogo que eles já sabiam onde ia dar, mas que queriam respeitar todas as fases, sem pressa, curtindo o momento e desbravando-se um ao outro... depois desses tais minutos e minutos, se renderam e se beijaram como se não houvesse o dia de amanhã, vivendo, se permitindo...
     Claro que, como tudo na vida, teriam eles que arcar com as consequências. E arcaram, juntos. Esperaram a poeira abaixar, os corações cicatrizarem e o tempo passar um pouco para que, após a confissão do que havia acontecido naquela noite, pudessem ficar juntos. E ficaram.
     E o segundo primeiro encontro dos dois foi ainda melhor que o primeiro... Os dois, na livraria, folheando livros sem ler, fazendo figuração, fingindo que estavam interessados em alguma coisa além do outro. Ela, tímida, mal conseguia encará-lo... os dois, no cinema, sentindo no peito um turbilhão de emoções... e, entre nostalgia, timidez, vontade afogada, se renderam ao desejo mais uma vez: se perderam e se encontraram, simultaneamente, num longo beijo apaixonado... E era apenas o começo.
     Ela contou, entre lençois, que o seu sonho era ser dançarina, mas acabou fazendo Direito com medo da incerteza e instabilidade da carreira... Ele contou, enquanto sorria com os olhos pela própria lembrança, do seu avô, que mal conheceu, pois morreu quando ele ainda era criança, mas que possuía uma lembrança muito forte do mesmo, "lembro como se fosse ontem", ele disse, do dia em que o seu avô confessou, num sussurar baixinho, que ele era seu neto preferido. Ela, enquanto cozinhava um macarrão para os dois, contou do seu irmão, de 10 meses, que fora adotado há 5 e de como ela o amava, mas ainda estava se acostumando com a situação... Ele contou, enquanto ela se maquiava para irem ao cinema, o porquê de querer ser poeta; disse que quer que as pessoas o leiam e encontrem paz, que quer que as pessoas o leiam e encontrem desejo de viver; disse ainda que não quer que as mulheres se apaixonem por ele ao lê-lo e sim que se apaixonem mais ainda por seus amores, por seus maridos e namorados. Ela, por sua vez, contou, enquanto brincavam um com o outro, que os seus relacionamentos, depois do seu primeiro namorado, sempre duram no máximo 6 meses. Ele ficou com medo e ela achou graça disso. Ele contou, de mãos dadas com ela pela rua, que sentia saudades da cidadezinha que havia morado na Inglaterra. Ela contou, enquanto mexia nos seus próprios cabelos falando com ele ao telefone, deitada no chão da sala com uma perna por cima da outra, cruzadas, de como amou Veneza e que, se ela se casar um dia, certamente a sua lua-de-mel será lá. Ele contou, enquanto colacava o CD que havia gravado para ela, que preferia cachorros a gatos. Ela, gateira convicta, fez cara feia, como uma criança fazendo pirraça. Ela contou, num dia qualquer, que em Florença, se apaixonou por uma pracinha e que toda tarde ia lá, ver o tempo passar, ouvir uma música gostosa e observar aquelas famílias, de italianos e gringos, mas todos apaixonados pela música, pelo verão europeu, pela vida! E acrescentou, assim, como quem não quer nada, que havia levado o livro dele para a viagem e que, um dia, o leu nessa praça gostosa, ao som daquela música que lhe tocava a alma. Ele se derreteu todo... E ela confessou que não foi só nesse dia, mas também em outros, em Budapeste, em Amsterdam, em Paris. E ele se derreteu mais ainda...
     Não chegaram a morar juntos, a casar, mas nunca mais ficaram separados, nunca mais desataram esse laço que amararam (que, por sinal, deve ter sido amarrado por ela, já que ele confessou não saber amarrar cadarços...). Havia acontecido. O "e se..." fora respondido. Eles descobriram como eram juntos e, simplesmente, gostaram. Ele para ela, nunca mais um mero poeta, calouro que de vez em quando esbarrava pelo corredor. Ela para ele, nunca mais só mais um rosto bonito, uma garota meio doidinha e independente. Eram especiais um para o outro e continuaram sendo, para sempre.

3 comentários:

  1. I really liked the conto... if it can be called that. Very honest, very open (and telling me things I have to admit I already knew about you). It also reminded me that we really have to catch up one of these days... :-) Ah, one thing I didn´t know was the dancer! But the conto in itself is beautiful, though it is not really a conto, it is more of a prose poem.... :-) Keep writing.

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  2. I have been thinking about this all week. Not just cause of what it says about you on a personal level (though I learned somethings and other things I knew were confirmed - and I have to say, you would have been, better, you are a good dancer, and although you are studying law, this does not mean you are not - or cannot be in the future - a dancarina..you can be what you want to be.. and you should be!!!) Back to the poem, I has been really on my mind, as a poem. I love it, it is a love story, a confessional poem, it is beautiful and I want more :-)
    By the way, keep being meio doindinha and MUITO(A) indepedent, keep being you, no matter what!
    Saudades and I´m looking forward to your next poem...

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  3. It's be a while since I put in a comment - and even longer since you put a new poem in! I know you're busy, but hopefully in a week or two, you'll be able to write again. I miss your poems. I also want to know how this conto is going :-) Me being nosey ha ha ha. :-(
    In the meantime, I came across this the other day, I think it is very nice. Have a look...
    http://www.youtube.com/watch?v=porI3sKslak
    Saudades, and hopefully one of these days I will get a nice surpise :-)

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